É o que diz um relatório do
Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) em
reportagem publicada nesta terça-feira, 13, no Uol.
O modelo de avião ATR 72,
que caiu na última sexta-feira, 9, e provocou a morte de 62 pessoas em Vinhedo,
São Paulo, já apresentou problemas por gelo durante voo entre as cidades de
Maceió e Salvador no ano de 2013. É o que diz um relatório do Cenipa (Centro de
Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) em reportagem publicada
nesta terça-feira, 13, no Uol.
Segundo a coluna do
jornalista Carlos Madeiro, o relatório, datado de 4 de outubro de 2021, foi
produzido após o órgão realizar uma extensa investigação do que ocorreu com a
aeronave durante a viagem. O Cenipa classificou o caso como um "incidente
grave" que teve "múltiplos fatores contribuintes". Os técnicos
investigadores indicaram que três fatores provocaram a perda de controle:
● Condições meteorológicas adversas;
● Decisões equivocadas da tripulação;
● Potenciais falhas e fatores de manutenção e projeto.
As condições meteorológicas
na última sexta-feira também apontavam para formação severa de gelo na rota do
ATR 72 que despencou em Vinhedo. Desde o dia do acidente essa tem sido uma das
hipóteses comentadas por especialistas para justificar a queda do avião da
Voepass, no entanto, só a investigação da Cenipa vai afirmar o que de fato
provocou o acidente.
De acordo com a coluna, o
voo citado entre Maceió e Salvador ocorreu no dia 26 de julho de 2013. A
companhia aérea que o operou foi a extinta Trip, que havia fundido operações
com a Azul em 2012. Assim como na aeronave da Voepass, o avião levava quatro
tripulantes e 58 passageiros. No caso, porém, a aeronave conseguiu pousar em
segurança e ninguém se feriu.
"O céu naquela noite
estava nublado a encoberto, com nuvens e cristais de gelo. O voo seguiu sem
problemas até a altitude de cruzeiro (16.000 pés), voando a uma velocidade de
202 nós (354 km/h). O voo decolou às 18h10 e tudo ia bem até 18h37, quando a
tripulação identificou "formações meteorológicas" e discutiu a
necessidade de desvios na rota", diz trecho da coluna.
Na conversa entre piloto e
copiloto, eles demonstram dúvidas sobre os dados apontados no radar
meteorológico. Sete minutos depois, eles percebem uma formação de gelo. A
partir daí, tem início uma sequência de 13 minutos de problemas, que levaram à
emergência na aeronave. Veja abaixo a sequência dos trechos publicados pelo Uol
e a coluna na íntegra:
● 18h48 - Comandante observa a queda de velocidade da aeronave
(estava em torno de 185 nós) devido à formação de gelo. A tripulação, então,
solicita desvios à esquerda para fugir de mau tempo.
● 18h49 - Comandante entrega o voo ao copiloto.
● 18h53 - Copiloto aciona as luzes de "atar cintos" e
solicita desvio de rota à esquerda.
● 18h54 - Gravador de voz da cabine registra som semelhante ao de
voo em uma região com chuva. Comandante retorna à cabine e reassume o controle.
● 18h59 - Gravador registra uma forte vibração no avião. A
potência dos motores é reduzida para 20% de torque, e a velocidade indicada cai
para 158 nós e começa a perder sustentação. Piloto automático é desligado.
● 19h00 - Início de vibração na cabine, aumentando
progressivamente de intensidade. Motores reduzem a potência de 72% para 20%, e
a velocidade chega a 148 nós.Nesse momento, ativa-se de forma automática a
campainha de "atar cintos" e soa um alarme triplo na cabine --entre
eles de estol (perda de sustentação). Copiloto declara mayday (emergência) e
solicita à torre a descida da aeronave.
● 19h01 - Acionamento dos manetes das hélices para a posição
bandeira (espécie de ponto morto). Vibração para, hélices são ajustadas de
volta a 82% de potência, e tripulação retoma o controle da aeronave e segue até
o pouso.
Nesse pequeno intervalo de
tempo entre o estol [perda de sustentação] e a recuperação, a aeronave chegou a
atingir um ângulo de ataque (entre a asa do avião e o fluxo de ar) de 52°, e um
ângulo lateral de 58º à esquerda. Houve uma queda de 5 mil pés de altitude.
Segundo o relatório, houve
momentos em que ele foi de um lado para o outro. O problema ocorreu quando a
aeronave sobrevoava o município de Esplanada (BA).
"A aeronave se
aproximou perigosamente do seu limite crítico, o que poderia ter resultado em
uma perda total de sustentação e consequente queda livre", afirma um
piloto, que pediu para não ser identificado. "No meu entender, foi
exatamente a situação que ocorreu [com o avião da Voepass]."
Erros e falhas - Segundo as
leituras do gravador de dados, não houve mau funcionamento ou falha do motor em
voo.
O Cenipa, em sua avaliação,
apontou que a decisão do comandante de reduzir a potência do motor em resposta
à vibração da aeronave "exacerbou a perda de velocidade aerodinâmica,
levando a um estol".
"A tripulação reduziu a
potência do motor em vez de aplicar potência máxima, como recomendado para
condições de gelo severo", diz o relatório do Cenipa.
Ainda para o Cenipa, houve
gerenciamento inadequado de tarefas e comunicação confusa na cabine, o que pode
ter atrasado a tomada de decisão e a aplicação de procedimentos corretos. A
tripulação alegou que interpretou erroneamente a vibração como um problema com
a hélice, em vez de um estol induzido por gelo, já que uma outra tripulação
havia relatado problema semelhante em janeiro.
Sistema potencialmente falho
- A investigação ainda aponta que o sistema APM (monitoramento de desempenho da
aeronave), projetado para alertar a tripulação sobre condições perigosas de
gelo, estava inoperante durante o voo.
A tripulação relatou não ter
observado qualquer indicação de que o APM se encontrava em "off". O
fato de ele estar desativado sem o conhecimento dos pilotos levantou
preocupação do Cenipa sobre a confiabilidade do sistema.
Antes desse voo, o livro
técnico da aeronave tinha dois relatos de falha no APM, nos dias 16 e 21
daquele mês. "Em ambos os casos, foram adotadas as ações e o problema foi
considerado solucionado", diz.
A ausência de um red bug
(indicador de velocidade mínima para voo em condições de gelo) no velocímetro
do comandante também pode ter prejudicado a consciência situacional, diz o
Cenipa.
Fabricante tomou medidas - O
relatório do Cenipa aponta que a fabricante realizou uma visita técnica à
companhia aérea para esclarecer eventuais questões referentes a procedimentos
de voo em condições de gelo.
O treinamento periódico dos
pilotos foi reformulado após o caso, dando-se maior ênfase ao gerenciamento do
voo em condições de formação de gelo na aeronave.
A ATR também identificou
áreas de melhoria em termos de redação, formatação e apresentação, para facilitar
a tomada de decisão da tripulação e a recuperação de informações essenciais
durante o voo.
Sobre as falhas no
indicativo do APM, a ATR disse que diz que fez extensa investigação, e que a
única condição identificada seria a falha do próprio botão de alerta.
Por TNH1
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